Noturno de Saudade


Fecho-me no coração de mais uma noite
E é de mármore-rosa, o seu hálito solto
de noite insone feita para olhar o mundo
de um terraço suspenso da memória
à beira de um céu de alazões de chumbo.
Suavemente percorro o caminho das tuas mãos
e encontro estrelas bordadas a silêncio
e são apenas espinhos que ficaram dos teus passos.
O murmúrio da cidade traz-me vozes extintas,
como nessa outra noite de todos os prodígios
quando nos cobrimos de flores do rio
e se quebraram no chão todas as raízes
e nos abeirámos da morte para rir dos
pássaros de olhar resoluto e frio...
Resumo-me a espantar na dor o pó dos meus dias
e a ouvir aquele marulhar da memória
que escorre nas horas de cascatas desmedidas,
quando a curva do tempo me traz nas suas águas,
o teu olhar azul-ametista reflectido .
Então sei qual a cor da ternura
e o vazio dos penhascos desfeitos de erosão.
Invento-te assim brisa de Verão como carícia,
como verbo, como liga de metais ou fusão de pedrarias,
na incandescência de um desejo
que escorre dos teus olhos para os meus dedos
em forma de palavra esvaída.
Apenas uma Lua peregrina assoma ao céu do teu olhar,
quando falas e sorris para lá do vento.
E o silêncio é de seda, como o toque dos meus dedos
nos momentos de pedra, ou arrepio, coisa breve,
mais fresca que espraiar de maresia...
Liberto os pássaros da memória
e adormeço-te no meu peito
como pergaminho desfeito pelo tempo
ou pelo suor acre do meu corpo...
e assim sonho o teu olhar imensamente louco...



Fonte:www.oblogdalibelua.blogs.sapo.pt

0 comentários: