Levarei amanhã a pensar em depois de amanhã,
E assim será possível; mas hoje não...
Não, hoje nada; hoje não posso.
A persistência confusa da minha subjetividade objetiva,
O sono da minha vida real, intercalado,
O cansaço antecipado e infinito,
Um cansaço de mundos para apanhar um elétrico...
Esta espécie de alma...
Só depois de amanhã...
Hoje quero preparar-me,
Quero preparar-rne para pensar amanhã no dia seguinte...
Ele é que é decisivo.
Tenho já o plano traçado; mas não, hoje não traço planos...
Amanhã é o dia dos planos.
Amanhã sentar-me-ei à secretária para conquistar o mundo;
Mas só conquistarei o mundo depois de amanhã...
Tenho vontade de chorar,
Tenho vontade de chorar muito de repente, de dentro...
Não, não queiram saber mais nada, é segredo, não digo.
Só depois de amanhã...
Quando era criança o circo de domingo divertia-rne toda a semana.
Hoje só me diverte o circo de domingo de toda a semana da minha infância...
Depois de amanhã serei outro,
A minha vida triunfar-se-á,
Todas as minhas qualidades reais de inteligente, lido e prático
Serão convocadas por um edital...
Mas por um edital de amanhã...
Hoje quero dormir, redigirei amanhã...
Por hoje, qual é o espetáculo que me repetiria a infância?
Mesmo para eu comprar os bilhetes amanhã,
Que depois de amanhã é que está bem o espetáculo...
Antes, não...
Depois de amanhã terei a pose pública que amanhã estudarei.
Depois de amanhã serei finalmente o que hoje não posso nunca ser.
Só depois de amanhã...
Tenho sono como o frio de um cão vadio.
Tenho muito sono.
Amanhã te direi as palavras, ou depois de amanhã...
Sim, talvez só depois de amanhã...
O porvir...
Sim, o porvir...
Álvaro de Campos
1 comentários:
Olá amiga! Fiquei muito feliz com a tua visita,
com o comentário e, principalmente por teres te
tornado seguidora do nosso humilde espaço. Isso
somente aumenta a minha responsabilidade de
melhorar tudo aquilo que crio e escrevo. Espero
que voltes mais vezes, pois será sempre um prazer
renovado. Algo que me deixou feliz também, foi o
fato de residires em Recife, minha terra natal.
Adorei o "Adiamento" de Alvaro Campos, muito bem
escrito e coordenado, porém, maiores comentários,
deixarei para depois de amanhã.
Ah! Não sou poeta. Sou só um enxerido. Com certeza,
aqui voltarei mais vezes, pois, também por
enxerimento, me tornei seguidor do teu belo espaço.
Isso, até quando permitires. É claro!
Beijos,
Furtado
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